
O Hidroavião de Alberto Bresciani convoca o leitor a uma viagem cujo plano de voo se pauta em certa contradição tranquila que intriga e encanta. A obra se anima por uma poesia caracterizada pela dinâmica de oscilação entre o trivial e o inusitado. Conforme ajuste o ângulo, o leitor enxergará a dimensão do cotidiano ou o horizonte do inusual, que estão às vezes justapostos no mesmo verso. Está, portanto, o leitor incitado a seguir a leitura a partir de um paradigma anfíbio, que o leva através da articulação do mais familiar ao desvão mais insólito da palavra poética. Os poemas do livro, apesar de caminharem pelos limites do infrequente, não se "enfeitam". Poesia não é adereço para Bresciani. Em seus textos, não há penduricalhos e decorações expletivas, uma vez que a poética deles emerge sem afetação ou virtuosismo artificial, nascendo sempre por verdadeira necessidade de expressão. Em termos de sentimento lírico, vige o "desamparo", que jamais se exibe por mecanismos de desespero, pois está articulado sempre ao desejo de liberdade imanente aos elementos água, terra e ar. Assim, o tom da voz é baixo, íntimo, como quem conversa de perto para melhor partilhar a vivência. Um resultado paradigmático dessa bem sucedida equação que faz voar o Hidroavião de Bresciani é o conjunto de "Seis poemas para Franz", em que o eu-lírico se objetiva no personagem título e pode criar versos que ficam na memória, como as boas lembranças de viagem: "É preciso dizer a Franz que a alma deve correr solta,/ sem a promessa mística de uma rota para Ítaca".
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